São Timóteo (26/1): a coragem, a audácia e o jeito

Santo do Dia, 24 de janeiro de 1969 

 

A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério tradicional da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.

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Há uma ficha sobre São Timóteo, discípulo de São Paulo, bispo e mártir. A respeito dele escreve Dom Guéranger o seguinte:

Timóteo nascido em Listres, na Lacônia, filho de pai gentio e mãe judia, praticava a religião cristã quando o apóstolo Paulo apareceu nessa região. São Paulo, sabendo da santidade de Timóteo, tomou-o por companheiro de viagem, mas por causa  dos judeus que se convertiam a Cristo e que sabia que o pai de Timóteo era pagão, circuncidou-o. Todos os dois chegados a Éfeso, o apóstolo fê-lo bispo, a fim de que  governasse essa igreja. Paulo escreveu-lhe duas cartas, uma de Laodiceia e outra de Roma, para dirigi-lo no exercício de seu múnus pastoral. Timóteo não podia aceitar que se oferecessem  aos  ídolos dos demônios o sacrifício devido somente a Deus. Um dia em que os habitantes de Éfeso imolavam vítimas a Diana, numa de suas festas, ele esforçou-se  para afastá-los dessa impiedade, mas eles o lapidaram. Os cristãos o transportaram semimorto e o conduziram a uma montanha das proximidades da cidade, onde ele veio morrer  no dia nove das calendas de fevereiro, aproximadamente dos anos de 95 e 96”.

Ainda a respeito de São Timóteo, uma visão de Catarina Emmerich, que passarei a ler:

Vejo a Timóteo, discípulo de São Paulo, como um homem de alta estatura, moreno, magro e pálido. Era muito estimado. Mantinha uma comunidade de convertidos. Até os soldados que o rodeavam queriam-lhe bem. Havia ali, em Quios, uma mulher nobre cristã que caíra em grave culpa. Indo Timóteo celebrar os sagrados mistérios numa pequena Igreja, já no altar, conheceu por revelação a culpa dessa pessoa que chegava à Igreja para ouvir a missa. Saiu então o santo à porta e impôs à mulher penitência à sua culpa, impedindo-lhe a entrada. Em consequência disso, levantou-se uma perseguição contra o santo. Foi desterrado para a Armênia e libertado. São Paulo enviou-o como bispo de Éfeso. Nessa cidade foi morto, porque havia censurado energicamente as desordens e as orgias celebradas naqueles dias, com máscaras, levando ídolos em bacanais etc.”

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Os senhores podem aproximar esses dois dados, os da biografia propriamente histórica de D. Guéranger e a revelação de Catarina Emmerich, e os senhores notam uma concordância completa entre um aspecto e outro desta biografia. É importante notar dois aspectos: em primeiro lugar, a coragem dele para com o culto de Diana, em Éfeso.

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O templo que aí havia era um dos mais  célebres da gentilidade. E passava por ser uma das obras primas do universo. Realmente, tenho visto reconstruções desse templo e era uma beleza: feito com mármore branco, ficava no alto de uma escadaria e tinha a forma quase de um quadrado. A proporção entre escadaria como base e o templo em cima, dava um aspecto muito bonito, muito agradável de se ver.

Também com um teto muito bem proporcionado e uma  figura no alto. Era a tal arte helenística, que já não é propriamente a arte grega pura, mas misturada com alguma coisa do Oriente e que é hoje atacada pelos críticos artísticos, como  sendo pouco pura – talvez seja até -, mas que não deixou de inspirar algumas obras primas muito importantes da arte.

Acontece que nesse templo, o demônio falava, através da imagem de Diana, e fazia ações maravilhosas, mirabolantes; eram os prodígios do demônio. E São Timóteo, indo àquele local e querendo fazer cessar o culto, manifestou uma coragem, uma capacidade de enfrentar o adversário verdadeiramente extraordinária.

O resultado é que ele foi perseguido, lapidado e morreu.

Os senhores veem a mesma coisa com esta mulher nobre que foi à igreja onde ele ia celebrar Missa; teve conhecimento de que ela pecara e considerou que não podia deixá-la aproximar-se dos santos mistérios. Então exigiu que ela  fizesse uma penitência na entrada da igreja; ela não quis. Era uma mulher nobre e, naquele tempo, a nobreza tinha uma grande situação, pelo menos em vários países. A gente entrevê, pela narração, que ela tomou uma atitude de revolta, que açulou muita gente contra São Timoteo, fazendo com que fosse expulso, indo parar na Armênia etc., etc.

Em suma, os senhores estão vendo nos dois casos, sua mesma atitude. Ou seja, que diante do mal, diante do erro, uma posição de ataque frontal e fragrante, poderiam lhe advir inconvenientes, perseguições, mas ele não se incomodava e, numa dessas ocasiões, sacrificou a própria vida.

Isto quer dizer que se deva proceder sempre assim? Não podemos dizer que, muitas vezes, a TFP não procede assim? Muitas vezes a TFP não se esgueira? Houve uma pessoa que, com certo espírito, declarou que o animal que deveria figurar em nosso brasão não era um  leão, mas  uma raposa, de tal maneira  a TFP dá voltas “y vuelteretas”. E é verdade que nosso leão sabe dar passos de raposa, isso não tem dúvida nenhuma. Mas ele  sabe, às vezes, atacar como o leão…

O que acontece na vida de certos santos, por inspiração divina, têm uma linha de conduta que não é para ser seguidas por todo o mundo, mas para inspirar atitudes nos outros. São os santos que fazem coisas que são para serem admiradas por todos e não serem imitadas por todos. Mas que, na beleza de sua atitude, realizam algo que inspira outros a – no momento oportuno – fazer o que eles fizeram também.

É algo como São Francisco de Assis com seu pai, Pedro Bernardone. Este último brigou com o filho, houve todo um caso e acabou por lhe dizer: “então você não é meu filho!” São Francisco  tira a roupa e fica quase nu diante do pai e diz: Agora, graças a Deus fique com essa roupa, porque eu não sou mais filho do Pedro Bernardone. Pai nosso que estais  no Céu, agora mais veridicamente do que nunca eu posso dizer isso etc., etc.

Mas desse episódio não se deve deduzir que todo o mundo que brigue com o pai deve agir desse mesmo modo… Porém, há uma coisa em seu gesto que inspira a discordar dos pais, nos momentos oportunos e com os devidos respeitos. Isto não equivale, portanto, que se deva brigar com os pais sistematicamente…  mas, ensina a tomar uma atitude enérgica quando for o caso.

Assim também a TFP tem lances de muita energia. Tem lances de uma energia  bravia. Mas há horas em que a gente deve ser audacioso e há horas em que a gente deve ser jeitoso. Devemos admirar nos santos a audácia e o jeito. Santo Inácio de Loyola foi extremamente audacioso… e extremamente jeitoso também. Aqui, com São Timóteo, é um santo admirável que nos mostra a audácia.

Os senhores me perguntarão: Dr. Plinio, o que o senhor admira mais: a audácia ou o jeito?

Sou obrigado pelas circunstâncias, a todos os jeitos e trejeitos. Meu coração e minha alma vão para a audácia. Mas, o que se pode fazer? Deus me livre de faltar com a audácia quando eu tenho que ser audacioso. Deus me livre de faltar com o jeito quando tenho que ser jeitoso.

Espero que os senhores rezem por mim e que  São Timóteo nos ajude a todos nós. Porque a audácia é uma atitude mais difícil do que o jeito. A audácia supõe que a gente arrisque a pele e o jeito. Muitas vezes, o medo se camufla atrás do jeito.

De maneira que mais vale a pena insistir sobre a audácia do que sobre o jeito. Quando eu notar que os senhores estão muito audaciosos, preparam-se, porque eu falarei sobre o jeito. Porque não há uma coisa pior do que uma audácia sem jeito.

Aqui fica o Santo do Doa de hoje, que Nossa Senhora os ajude.

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