À procura de almas com alma

 

 

Excertos do pensamento de

 

Plinio Corrêa de Oliveira

 

recolhidos por Leo Daniele

 

SEGUNDA SÉRIE

 

 

Edições Brasil de Amanhã

São Paulo, 1998

 

 

[Para ler o cap. I, clique aqui; e o cap. VI]

 

 

 

VII

 

A "música" das almas com alma

 

Secção primeira

 

EU

 

 

Despertando para a vida, conhecendo-se a si mesmo

 

Na alegria primeva, que tínhamos quando crianças, a alma se maravilha ao começar a perceber os diversos seres.

Na inocência* se tem o gáudio de quem começa a existir, como de quem acaba de se formar na mão de Deus.

Era como se a pessoa ainda sentisse em si as “marcas digitais” de Deus, que acabou de modelá-la.

É como um “Adãozinho” — infelizmente, fora do Paraíso — diante dos diversos seres que para ele dão uma impressão paradisíaca!

A grande alegria desse tempo era a impressão de, por assim dizer, estar saindo das mãos de Deus e de encontrar  outras criaturas.  Como Deus as criou para nós, quando as encontramos temos a sensação de que Deus acabou de pô-las ali, naquele momento.

Trata-se de uma novidade cheia de luz e de eternidade.

Sobretudo algumas crianças — isso não é comum em qualquer criança — têm uma certa noção da nobreza de sua própria alma.

Não se trata, absolutamente, da idéia aristocrática terrena.  Elas, olhando no fundo de si mesmas, percebem que existe alguma coisa de muito elevado e de muito nobre, que já habita ali.  Eu acrescento, sem vacilação: de muito santo!  Quer dizer, muito conforme à ordem sobrenatural.

A criança discerne em si mesma a própria graça de Deus, que pousa sobre ela toda, mas especialmente sobre aquilo por onde ela é especialmente ela mesma, e por onde ela é diferente de todo mundo.

A criança chega até a notar em si mesma algo de divino, entendido  em termos católicos1.

Imagino que uma criança, a partir dos três anos, já possa ter algo do que está explicado acima. Talvez  antes, não sei.

 

 

Cada homem é único e irrepetível

 

Existe um princípio profundo pelo qual cada um recebe, diretamente de Deus, alguma coisa que Ele não deu a ninguém.

É seu próprio ser individual que faz com que em cada um a individualidade seja só sua entre todos os homens.

Cada um não só recebe isto, mas também o deve dar a todos. 

As minhas semelhanças com os outros homens são embebidas de minha peculiaridade.

Todo homem, visto por algum lado, é só dissemelhança.  Visto por outro lado, é só semelhança. 

 

 

Notas:

 

(*) Inocência: O conceito pliniano de inocência vai muitíssimo além da acepção corrente da palavra. Não se trata apenas de não praticar o mal, mas sobretudo de aderir fortemente à harmonia do Verdadeiro, do Bom e do Belo. Inocente é quem não pecou contra aquele estado de espírito primevo de equilíbrio e temperança, e por isso conserva-se aberto a todas as formas de maravilhoso  e apetente delas.

 

1. Nota-se aqui, como em outras passagens desta obra, a preocupação do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira de marcar sua distância em relação a qualquer forma de imanentismo ou panteísmo. Para usar a comparação do ilustre líder católico, quanto mais o sol for sol, e a planta for planta, maior a complementação. O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira afirma aqui uma verdade que vai na contra-mão de certa tendência moderna, segundo a qual, para haver união, é necessário anular ou achatar as diferenças entre as pessoas. Pelo contrário, o fato de ser típico, de ter forte personalidade, de ser saudavelmente diferente, é fator que, de si, reforça a união, pois enseja a complementação entre as pessoas.