"Diferentes linhagens

do pensamento conservador brasileiro

em sua história recente"

 

 

 

 

  Bookmark and Share

Em São Paulo, para debater sobre as “contradições da direita contemporânea: diferentes linhagens do pensamento conservador brasileiro em sua história recente”, o CEDEM, Centro de Documentação e Memória da Unesp – Universidade de São Paulo, patrocinou evento na quinta-feira, dia 30 de abril de 2015, em sua sede na Praça da Sé, 108, 1º andar.

Segundo o anúncio, “o afloramento dos conflitos sociais que o último período eleitoral brasileiro trouxe a tona desperta o interesse e, ao mesmo tempo, faz com que o momento seja propício para discussão das diversas linhagens que foram constituindo o pensamento conservador brasileiro ao longo do século XX. Ao recuar para as décadas passadas esse debate pretende refletir sobre como foram geradas essas formas de encarar o mundo e como diversos desses conceitos continuam a informar todo um conjunto social que se bate em defesa da ordem constituída e na busca de reverter mesmo os avanços sociais conquistados dentro dessa ordem. Para isso os pesquisadores convidados abordarão três vertentes com importantes diferenças entre si, mas que ajudaram a formar um mesmo caldo cultural hoje presente na sociedade brasileira:

• a regressividade representada pelo Integralismo,

• o conservadorismo de matriz católica representado no Brasil pela Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP)

• e o arcabouço jurídico de manutenção de ordem forjado pelo ex-ministro da justiça Alfredo Buzaid”. 

DEBATEDORES:

Antonio Rago Filho - Professor, Doutor do Departamento de História da PUC-SP e do Centro de Ciências Sociais da Fundação Santo André. Coordenador do Núcleo de Estudo sobre Trabalho, Ideologia e Poder da PUC-SP (NETIPO).

Luis Felipe Loureiro Foresti - Mestre em História Social pela PUC-SP e Pesquisador do Núcleo de Estudo sobre Trabalho, Ideologia e Poder da PUC-SP (NETIPO).

Rodolfo Costa Machado - Mestrando em História Social, Bacharel em Direito, ambos pela PUC-SP e Pesquisador do Núcleo de Estudo sobre Trabalho, Ideologia e Poder da PUC-SP (NETIPO). 

Moderadora: Sonia Maria Troitiño Rodrigues, Professora Doutora do Departamento de Ciências da Informação na UNESP Marília/SP. Ex-Diretora do Centro de Arquivo Permanente do Arquivo Público do Estado de São Paulo, com experiência na área de Arqueologia. É Coordenadora do CEDEM – Centro de Documentação e Memória da UNESP.

https://www.maxpressnet.com.br/Conteudo/1,748580,Contradicoes_da_direita_contemporanea,748580,8.htm

A sessão - Com vagas para 60 pessoas, o auditório estava ocupado - em sua grande maioria - por “ativistas de esquerda”, como os qualificou o Prof. Rago, em suas palavras iniciais de boas vindas. Eram professores, líderes comunitários, universitários de ambos os sexos etc.

Na parede atrás dos conferencistas, durante toda a sessão, ficou projetada a foto abaixo, da passeata de 1964, com faixa onde se lê: 

 

O BRASIL NÃO SERÁ UMA NOVA CUBA

 

Os conferencistas fizeram paralelo com as manifestações populares realizadas no Brasil nos dias 15/3 e 12/4/2015, onde havia cartazes com dizeres similares.

 

A seguir, transcrição do áudio do vídeo acima, que julgamos interessante disponibilizar aos nossos visitantes, pois demonstra - com depoimentos de pessoas que se encontram em posição oposta ao do Prof. Plinio - a atualidade e importância de suas ideias e de sua figura no panorama nacional contemporâneo:

Mediadora: (...) “Reações diversas que vem acontecendo nos últimos meses, mais que doze meses por assim dizer e cuja discussão se faz necessária, porque essas reações atuais, esse momento conturbado, ele não nasce simplesmente hoje. Ele tem algumas raízes anteriores.

O Prof. Antonio Rago Filho, o Luis Felipe Foresti, o Rodolfo Machado, eles vem recuperar, esclarecer para a gente um pouquinho, das origens e das diferenças dessas diversas vertentes do pensamento conservador brasileiro, ao longo de todo o século XX.

Um dos objetivos principais da mesa é justamente é refletir como foram geradas e como permaneceram esses resíduos ao longo de toda a história de o século XX e que hoje acabam desembocando no que a gente tem presenciando, no que a gente tem vivendo.

Cada dos palestrantes da mesa vai apresentar uma vertente diferente do pensamento. O Prof. Rago vai iniciar sua fala, iniciar esse debate, apresentando, sobre a regressividade, representado pelo movimento, pelo integralismo.

O Luis Foresti que vai sobre o conservadorismo de matriz católica, representanda no Brasil, especialmente pela Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, a conhecida TFP e o Rodolfo vai finalizar discutindo um pouco sobre o arcabouço jurídico de manutenção da ordem forjada especialmente pelo ex-Ministro de Justiça Alfredo Buzaid ”. (...)

(NR: passa a fazer a apresentação dos debatedores)

(...) Prof. Dr. Luis Felipe Foresti: Ao fazer a pesquisa, ao procurar entender essas formas conservadores de pensamento e de atuação, ele facilitou um pouco o meu trabalho.

Eu vou falar agora de outro Plínio. O Plinio Corrêa de Oliveira, líder, pensador católico bastante importante no Brasil e não só no Brasil. Ele é um cara que vai ter uma difusão internacional bastante forte, né, e é o fundador da TFP. Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, mais conhecida como TFP.

E a primeira coisa legal de trazer o Plínio Corrêa aqui para essa mesa, trazer a própria TFP. É porque a percepção... a TFP acabou virando uma espécie de marca, uma espécie de grife, como rótulo para certos conservadorismos.

Eu não sei se vocês... aquela música, a música é velha, antiga, da década de 80, aquele samba-enredo da TFP, que óbvio eu não vou me aventurar aqui a cantar, mas é aquela associação à TFP de todos os conservadorismos. Inclusive do conservadorismo integralista.

A música brinca uma hora, fala de Plinio Corrêa fazendo Anauê. E o Plínio nunca foi integralista. Muito pelo contrário. Tem uma condenação tanto ao integralismo. Não que o absolva de nada. Tem uma condenação tanto ao integralismo, ao fascismo, quanto ao nazismo que é de primeira hora.

Porque que eu estou falando isso? É muito importante que a gente consiga entender isso. Entender a real configuração de cada um desses conservadorismos que a gente está apresentando aqui hoje, para que a gente consiga para a gente entender como eles mobilizam certos setores sociais. Ou seja, que função essa visão de mundo vai cumprir.

Eu defendo que o Plínio tinha uma visão de um mundo... articulada, coerente, defendo porque acho que a realidade me mostra isso. Me permite afirmar isso. Que foi capaz e ainda é capaz de mobilizar, tanto na sua totalidade a ação de certos grupos sociais, quando vetores desse pensamento estão presentes na ação desses conservadorismos contemporâneos.

Não é a toa que a gente escolheu para o debate essa imagem. Essa imagem é das manifestações da década de 60. A última vez que a direita esteve tão forte na rua antes de agora. E é um cartaz que a gente viu agora em manifestações coetâneas.

Para eu tentar não me alongar aqui, o pensamento do Plínio. Plinio Corrêa de Oliveira, ele é um pensador católico, que começa a atuar lá na década de trinta. Com uma visão bastante regressista num sentido diferente do que a gente usa no integralismo, de uma visão de volta ao passado, que no começo ele está atuando ali em sintonia com Alceu de Amoroso Lima, com aqueles pensadores do Centro Dom Vital, de um grupo conservador católico forte, e depois vai romper, parte por mudança de posição da Igreja, parte por mudança de posição desses outros pensadores, o Alceu, o Tristão de Athayde é um cara que... uma figura fascinante que vai ter várias mutações ao longo do seu percurso. E se torna um dos principais líderes católicos no Brasil e depois toma uma vertente muito liberal.

Plinio começa muito alinhado com ele, mas vai ser um cara conservador até o final. E o que constitui o conservadorismo do Plinio? Ele defende uma volta ao passado. Volta ao passado nos seguintes termos. Ele tem uma idéia de Idade Média, que seria aquilo que normalmente... hoje, comparado com aqueles historiadores muito século XIX que identificaram a Idade Média como idade das trevas. Só que para o Plinio, isso que muitos leram como idade das trevas, era o paraíso na terra. Paraíso na terra,

Porque? É o momento que ele indica na história mundial a maior sintonia entre o elemento divino e o elemento terreno. Em outras palavras. É o momento em que ele identifica na história mundial, a maior concordância entre do que estaria... do que seria uma pré-disposição divina de como esse mundo se configurou.

Um mundo hierarquizado. Dividido naturalmente entre grupos sociais, que tem essa função, num plano terreno, advinda de um plano espiritual, no caso, advinda de Deus, um mundo plenamente hierarquizado, onde você tem dominantes e dominados. Senhores e servos.

E ele enxerga que essa ordem terrena que chegou mais próxima da perfeição na Idade Média começa a ser rompida com o que ele chama de Pseudo-Reforma. Que na verdade é a reforma protestante. Ele tem uma visão de mundo que enxerga três grandes rupturas num processo uno que ele vai denominar de A Revolução.

A primeira que ele chama, a reforma protestante, que chama de pseudo-reforma, que seria o igualitarismo no plano teológico, ou seja, a idéia de que é possível ao homem, a qualquer homem, interpretar os desígnios de Deus.

O segundo momento dessa Revolução ele associa com a Revolução Francesa. Que é esse igualitarismo descendo ao plano, legislar, ao plano jurídico. Ou seja, a idéia de que perante a lei os homens podem ser iguais. Coisa que ele obviamente ele discorda.

E o terceiro momento desse processo uno que ele vai dizer aqui que é a Revolução, se dá em 17, para ele é a Revolução russa. Onde esse igualitarismo teria descido ao plano social. Que aí seria a idéia de que os homens são iguais. Ele acha isso evidentemente, não é força de expressão, acha isso o inferno na terra. Ele acha que isso é a corrupção completa da ordem divina.

Nesse sentido, o Plinio vai empreender toda uma luta, que vai desde sua militância na década de 30, até a fundação da TFP, até a publicação do livro chave, que é esse aqui, chamado Revolução e Contra-Revolução. Em 1959. Que é o manifesto da fundação da TFP.

Até a fundação da TFP na década de 60, toda a militância dessa organização, que hoje se transmutou em outra coisa, depois da morte dele, mas está viva. Está aí atuando em diversos grupos. Para defender essa volta ao passado. Aí retomando aquilo que o Rago falou.

O que interessa aqui é entender como essa volta ao passado, como essas idéias mobilizam certos setores. A volta ao passado, embora o Plinio defenda, e vá dizer da estrutura medieval, o medievo vai ser sempre o teto, o objetivo dele.

Conforme você vá descendo a leitura dos textos plinianos, você percebe que essa volta ao passado não é exatamente uma volta ao passado medieval. Sob a égide dessa volta a esse passado medieval, uma defesa da sociedade atual, do status atual. De que maneira? Com uma sociedade onde você vai ter um grupo dominante e um grupo dominado.

O Lukács (NR: filosofo húngaro György (ou Georg) Lukács. Essas idéias estão expostas (entre outros) em seu livro "Existencialismo ou Marxismo" na parte em que o autor trata do declínio da filosofia burguesa) quando ele fala do declínio da filosofia burguesa, ele tem uma frase de que eu gosto muito, em que ele fala : a partir da consolidação do capitalismo, aqueles primeiros filósofos liberais que eram radicais, que militavam por uma transformação radical, num período onde o capitalismo não estava consolidado, eles não tem mais chão social para existir, então os filósofos liberais da época, do declínio da filosofia burguesa, ele usa essa expressão, eles vão ser os guardas de fronteira do liberalismo.

Ou seja, é aquele pensamento que não vai mais se impor porque senão vai acabar, superando aquela própria ordem, então ele é um pensamento que inverte, inverte o que aqueles primeiros filósofos liberais fizeram, não invertem, muda a entonação do que aqueles primeiros filósofos liberais fizeram e vira um pensamento de manutenção da ordem.

E é exatamente isso que o Plinio faz. Sobre a argumentação da volta ao passado medieval, ele vai sempre cumprir a função social de manutenção dessa ordem de exploração do homem pelo homem. Essa manutenção dessa ordem onde você tem dominantes e dominados.

 

O Plinio vai fazer essa leitura por uma... e aqui é até legal marcar a diferença dele com o integralismo ou com o nazis-fascismos. Porque que o Plinio, desde a década de 30, um crítico – isso chega até a ser engraçado – porque o Plinio durante a década de 70, um grande antagonista dele vai ser o Dom Helder Câmara. E ele não vai perder chance de fustigar o Dom Helder, porque o Dom Helder ali na década de 30, transitou ali, mais do que isso até, estava ali no meio dos integralistas. E o Plinio, nunca!

Só que porque o Plinio nunca se juntou a esses conservadorismos? Porque o que sempre o assustou, tanto no nazismo quanto no integralismo é o componente plebeu. O componente de massas.

Plinio advogou desde seu primeiro livro, lá sobre a Ação Católica, na década de 40, que as massas não tem condição de fazer história. Não tem condição de agir no mundo. Tanto que a primeira grande intervenção pública do Plinio é um debate com Alceu, não é a primeira, mas é a que rompe as barreiras... que rompe a barreira do internacional, a que tem aprovação do Vaticano, do Pio XII, é o livro que ele escreve em 43, sobre a Ação Católica, onde ele vai, ele tem uma disputa com o Alceu Amororo Lima, que o Alceu muito apoiado na filosofia do Jacques Maritain, defendia que os leigos deviam estar mais inseridos no comando da Igreja.

E o Plinio entende que só um grupo de elite pode estar inserido no comando da Igreja. Não só da Igreja. Mas da Ação Católica. No comando de qualquer associação. Esse primeiro grande debate dele, ou seja, defendendo uma elite por natureza, uma elite de bens nascidos, como os circuladores da vida no mundo, vai se manter até o fim da vida dele.

O último livro que o Plinio escreve chama Nobreza, na verdade o livro chama Nobreza e Elites Análogas nas Alocuções de Pio XII. É um livro enorme. Mas para você ter uma idéia, é a época em que João Paulo II tinha adotado com o signo do episcopado latino-americano, da opção preferencial pelos pobres, e o Plinio vai lançar a dele, que é a opção preferencial pelos nobres.

É um chiste com... antipapal, mas que dá bem a forma como ele vê essa divisão do mundo. E é, para a gente entender o percurso desse conservadorismo na década de 60, é importante notar... eu estou dando só algumas pinceladas, eu sei que a gente vai ter um debate depois, senão o tempo não vai dar ´para falar tudo que eu queria... mas outra coisa que eu gostaria de chamar a atenção é como isso vai gerar afastamento do Plinio com a própria Igreja Católica.

Porque se no começo da militância dele, ali na década de 30, você pode dizer que tirando um ou outro ajuste pontual, ele está plenamente afinado com os ditames advindos do Vaticano, pós João XXIII e notadamente pós Concílio Vaticano II, começa a haver uma ruptura. Uma ruptura que na leitura da TFP, dá em coisas muito interessantes.

A Igreja, para ele, é a interprete autorizada da vontade... e o Papa o interprete da vontade de Deus na terra. Isso funcionava muito bem até Pio XII. Pio XII aprova um dos livros do Plinio. Chama ele de especialista no tema. Esse livro que eu falei sobre a Ação Católica. Diz que o livro merece ser lido por todos.

Com João XXIII não há grande conflito. Não há grande conflito com a figura do João XXIII. Há uma enorme ruptura com o Concilio Vaticano II. Com Paulo VI, Plinio tem conflitos a ponto de em 1974 chegar a publicar uma declaração de Resistência ao Papa.

Como para a TFP era impossível romper com a Igreja, ele faz uma declaração, baseada num episódio bíblico, que ele cita de quando Paulo resistiu a Pedro. Que seria mais ou menos o que ele faria. Ele como se ele fosse o único interprete autorizado. Ele jamais romperia com a Igreja.

Era como se Paulo VI tivesse rompido com a Igreja. Claro que ele não pode afirmar isso textualmente do Papa. Então ele vai por o Papa como um interprete menos autorizado que ele, por conta dos erros que comete, não vai dar tempo de falar de todo debate de Plinio com Paulo VI, a gente pode voltar também nos debates, porque eu queria trazer o que são os resgates desse pensamento pliniano, hoje, na atualidade.

Como eu falei, o Plinio é e um líder, que começa a militar na década de 30. Funda a TFP, que é um grupo de atuação muito presente nas décadas de 60, muito presente na Marcha da Família com Deus, muito presente na década de 60, década de 70, década de 80, esse grupo começa a minguar um pouco... na década de 80.

Você acaba tendo dois fatores, desde da derrocada daquilo que alguns autores... eu acho até um termo péssimo, só para ficar claro, alguns autores chama de comunismo real, desde a derrocada do comunismo do bloco soviético, até a questão da própria redemocratização do Brasil.

Então a TFP... aquele discurso eminentemente político, eminentemente anticomunista – o Brasil não será uma nova Cuba – ele perde um pouco de força ao longo década de 80. Na década de 90, o Plinio morre. Isso acaba por gerar algumas cisões na organização.

E é assustador ver como esse discurso é resignificado hoje em dia! Eu comecei a estudar o Plinio Corrêa de Oliveira, comecei a ter contato com isso, lá para 2010. E a primeira vez que eu tive contato com o Plinio...

Eu esqueci de falar isso: o Plinio foi colunista da Folha de São Paulo, durante... ele foi o colunista mais longevo da Folha de São Paulo, acho que até hoje. Durante quase 30 anos.

Eu tinha impressão que existem permanências do pensamento pliniano hoje disseminadas, mas o pensamento dele, in totum, não é reivindicado por ninguém.

E nos últimos anos a gente tem visto, uma retomada assustadora desse pensamento dele, inclusive na sua totalidade, em diversos segmentos. Existe um Instituto chamado Instituto Plinio Corrêa de Oliveira, que é liderado pelo Adolpho Lindenberg, que é um primo, empreiteiro né, um primo do Plinio Corrêa, que busca hoje a difusão desse pensamento.

Talvez seja hoje o grupo maior que reivindica diretamente a divulgação do pensamento do Plinio. Agora se você pegar por exemplo, grupos religiosos observadores que fazem muito barulho. No Legislativo, por exemplo. Não sei se vocês já se depararam com aquele padre Paulo Ricardo. O Padre Paulo Ricardo (risos), que é um religioso que bate ponto por exemplo na Assembléia Legislativa aqui de São Paulo, que é um cara que busca ditar uma agenda conservadora. Ele é uma releitura do Plinio de batina.

Ele tem... tirando aquela parte da cisão... que agora... até a parte da cisão com a Igreja está surgindo com a ascensão do Francisco. Ele é um Plinio de batina! Tirado aquela parte da cisão com a Igreja. Até a parte da cisão com a Igreja está surgindo com a ascensão do Francisco.

As argumentações do Reinaldo Azevedo ou do Rodrigo Constantino quando escreveu aquele artigo dizendo que o Papa Francisco não era economista. Um artigo amalucado. Que o Papa Francisco não era economista. Logo não deveria comentar economia.

Aquilo é uma argumentação tipicamente pliniana. Típico! O artigo poderia ser dele. Com alguma reverência a mais para falar do Papa, mas o artigo podia ser dele.

O que eu acho interessante de trazer o Plinio para essa mesa – claro que ficou aqui um pouquinho rápido – mas é mostrar como esse discurso dele, volta ao passado, serve para mobilizar um grande grupo social, mas como essa volta ao passado, mais do que um retrocesso puro e simples, acaba sendo uma busca de legitimização de uma ordem social constituída, nessa exploração: de um grupo dominante, que naturalmente deve ser dominante, e um grupo submetido que naturalmente deve ser submetido. Por hora é isso. A gente conversa mais daqui a pouquinho.

Mediadora: Muito obrigada Felipe. Representantes simbólicos, não sei, talvez até eu esteja forçando demais chamar de ícones, desses pensamentos que foram Plinio Salgado, Plinio Corrêa e Alfredo Buzaid, que em comum, são três posições conservadoras, todas de matriz católica, que se diferenciam na sua construção, por assim dizer.

Eu gostaria que vocês comentassem o que hoje em dia a gente ainda consegue perceber, o que é possível reconhecer, nos discursos atuais, em relação as permanências desses pensamentos. Cada um em relação ao seu autor. E que ainda resiste. Que a gente percebe que está por aí circulando.

Luiz Felipe Loureiro Foresti: Começo eu. Eu tentei falar rapidinho dessas permanências... no caso do Plinio.

Você tem desde um grupo que reivindica, de alguns grupos que reivindicam textualmente todo o pensamento dele, mas o que mais chama a atenção, são essas reivindicações de segmentos específicos do pensamento dele.

Por exemplo, falando do elitismo do Plinio. Esse elitismo do Plinio tem uma grande raiz tomista. Ele é muito calcado em São Tomás de Aquino.

Quando o Plinio está falando de como deve ser a transmissão e a gestão de conhecimento para qualquer grupo social, ele dá um exemplo da Suma Teológica, ele fala: São Tomás de Aquino falava que é melhor que você tenha leis. As leis tem que ser estabelecidas. Por que? Numa situação que haja uma quebra, você nunca vai ter homens sábios o suficiente para julgar e muito menos homens sábios para fazer a lei.

É muito aquilo que o Rodolfo trouxe. Há uma elite, há uma casta, e aí o caso desse pensamento de matriz religiosa, isso está dado fora do espectro social, a posição que cada um tem está dada de fora, há uma elite que é capaz de ter essa capacidade formulativa que é a grande capacidade, desculpe, que a grande maioria da população não tem.

Você tem hoje na grande mídia por exemplo, uma reivindicação, uma interpretação tomista, você vai ver no Jornal Nacional? Não. Claro que não. Mas essa linha de raciocínio está presente em grande parte dos comentaristas políticos hoje em dia. A idéia de entendimento político, ela continua tão elitista como em São Tomás de Aquino.

Isso é muito reverberado, aquele pensador que escreveu “A cabeça do brasileiro” e ele tem um truque que é ótimo. Ele pega na hora. As pessoas mais informadas, mais educadas, votam de tal maneira. Quem é que está aí completamente... as pessoas mais educadas e por educação ele está chamando a instrução formal, são aquelas de uma classe social que lhes possibilita a instrução.

Então, tal qual São Tomás de Aquino, e tal qual o Plinio, ele está fazendo tábula rasa de todas as questões de classe, de como essas classes sociais se estruturam na sociedade, para pegar isso por fora do mundo. Há uma reivindicação textual? Não há, mas isso está presente.

Se eu fosse desdobrar vários outros indicadores plinianos, a própria interpretação bastante conservadora do catolicismo. A gente está pondo aqui pensamentos de matriz cristã, conservadora... eu até falei do Alceu aqui, de toda uma outra linha de pensamento de matriz progressistas também, calcadas no cristianismo.

Essa interpretação conservadora por exemplo... sempre que se usa... ou a própria interpretação naturalista... quando você vê hoje muitos falando contra uniões homoafetivas por um princípio de que isso não constituiria uma sociedade, se só existissem homossexuais, isso impossibilita de construção de sociedade, a referência vai ser sempre religioso.

Porque você está partindo vai partir de um referencial naturalista de sociedade e por natural ser melhor do que o histórico e socialmente construido, é porque o natural é dado de fora por uma figura divina.

De novo, não há uma reivindicação explicita desses referenciais. Mas ele está completamente imbricado. Então é muito assim que eu vejo a permanência, que é mais do que uma permanência. É um elemento constitutivo desse conservadorismo coetâneo.

Prof. Antonio Rago Filho – (...) Então a Rede Globo coloca: olhem esse líder desse MST, a maior liderança que nós temos da realidade brasileira, é posta pela mídia como um usurpador. Então quer dizer, você vai falar: bom, mas nós... nem todo o público entende isso.

Mas se você vê um artigo desse Reinaldo Azevedo que ele fala: saiam as ruas no dia tal. Mas como um cronista, um comentarista põe o dia que você tem que sair na rua para derrubar a Dilma! Porque agora é chegado o momento.

Nós vivemos um momento... não é que a direita está tão forte assim.

O que ela pode causar é um confronto.

Aí, nos confrontos você sabe o que é uma luta, que que é guerra civil (...).

Então tomem cuidado!

Porque a ditadura criou o DEOSP, para entrar nos movimentos sociais, mas também nos movimentos militares. Então quer dizer que desde a década de vinte, os operários e as operárias, os estudantes, são controlados por essa gente que tem essa tradição.

Você falou corretamente. Somos o país, o estado, que no país preside o conservadorismo contra a classe trabalhadora. Porque sabem dos riscos que a classe trabalhadora pode trazer (...)

Luiz Felipe Loureiro Foresti: Para qualquer que esteja tentando seriamente entender o que está acontecendo hoje, é essencial. Na última manifestação que teve na Paulista, eles foram para rua e fizeram pesquisa qualitativa e quantitativa do que está pensando aquela galera que está lá.

Para você se entristecer eu vou dizer o que que essa galera citou como os grandes intelectuais, os grandes formadores de opinião. A gente tem aqui uma seleção sensacional. Reinaldo Azevedo, Raquel Sherazade, Olavo de Carvalho. Marco Antonio Villa, Alexandre Garcia, Datena, Miriam Leitão, Jabour, William Wack, William Bonner, Diogo Mainardi. A lista fala por si.

Algum desses aqui é um grande pensador? Não. Isso é a fina flor da mediocridade. (...) Existem até alguns pensadores de direita interessantes. Eles não tem reverberação social. Para pegar um pouco o gancho que o Rodolfo falou, o que é assustador hoje... claro existe esse rebaixamento do nível...

Essa semana por exemplo, só para dar uma certa coerência, teve uma briga do Villa com Olavo de Carvalho. Villa chamou Olavo de Carvalho de medíocre. O Olavo de Carvalho por sua vez, chamou o Dom Odilo, Reitor da PUC, de comunista! Quem vem da PUC sabe que isso é impossível. Ele é um arquiconservador. (...)

O Gramsci falava que devemos ser pessimista na análise e otimista na ação. Tentar analisar pelo pior cenário, mas tentar agir para mudar isso. Eu acho que a gente consegue, a esquerda... eu acho que se é assustador que toda essa direita tenha ido para a rua, e de fato a direita nunca esteve tão forte na rua quanto nessa época, comparando hoje, é a primeira vez que ela tem uma vinda para a rua, tão grande quanto nessa época. Agora, você tem momentos, você tem um momento de ruptura, e isso não é só no quadro nacional.

Nós vivemos numa sociedade, num mundo, que é horrível, que é desumano, e essa desumanização cada vez se acelera mais. Você tem um aprofundamento dessas desigualdades. Do mesmo jeito que esse sistema do capital gera potencialidades como nunca antes gerou (...) você tem a aprofundamento dessas desigualdades. Eu também quero quer que essas crises, esse ponto de inflexão podem gerar saídas alternativas (...)

Nós não podemos esperar. Nós temos que trabalhar para que a gente exatamente consiga. É ir para a rua. E se por contra essa ofensiva conservadora, na rua. Não há outro jeito.

Não há uma confiança na política constitucional. Não vai. Não é possível barrar esses avanços conservadores se a gente acreditar... e o PT, errou redondamente nisso ... Assumindo a política institucional, como se não houvesse amanhã. Assumindo o resultado da urna como se não houvesse outros condicionantes. Como se essa democracia burguesa de fato representasse de fato uma democracia real, vai, para usar um termo pouco preciso.

Então eu acho que a saída é essa. É ir para a rua.

A esquerda vai ser o que a gente conseguir mobilizar. Na rua. E só aí.

Porque inclusive porque a direita está se mobilizando na rua.

Então é bom que a gente faça isso rápido”. (...) 

* * *

Nota: Ao longo de 262 páginas, Luis Felipe Loureiro Foresti, apresenta Dissertação à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, para obtenção do título de Mestre em História Social, acompanhando a vida do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, desde seus 20 anos até 1995:

O arauto da contra-revolução: o pensamento conservador de Plinio Corrêa de Oliveira (1968 – 1976)