Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

São Lino, Papa e mártir

O "sensus Ecclesiae"

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Santo do Dia, 23 de setembro de 1965

  Bookmark and Share

 

A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério tradicional da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.

Hoje é festa de São Lino, Papa e Mártir.

Comentário de Dom Guéranger, em sua obra “L’Année Liturgique”:

“Uma obscuridade misteriosa cerca a vida dos primeiros vigários do Homem-Deus. Assim se esquivam aos olhos os primeiros fundamentos de um monumento para desafiar a sua duração. Carregar a Igreja Eterna é bastante para a sua glória. Bastante para justificar a nossa confiança e animar a nossa gratidão. Esta festa é o testemunho da Igreja pelo humilde Pontífice que primeiro foi reunir-se a São Pedro nos Criptas Vaticanas.

“O Liber Pontificalis nos diz que São Lino era de origem toscana e que ele se tornou Papa sob Nero, após a morte de São Pedro. Ele ficou sobre o Trono Pontifical de 56 a 76/79, morreu mártir e foi sepultado no Vaticano. Por falta de documentos mais seguros relativos à vida de São Lino, a escolha feita dele para suceder São Pedro durante a terrível perseguição de Nero, nos garante sua eminente santidade e justifica ela mesma o título de mártir com o qual ele é honrado”.

 

Relicário que guarda o crâneo de São Lino. Catedral de Volterra (Pisa), Itália.

O pensamento de Dom Guéranger é cheio de fé e muito bonito.

Ele diz propriamente o seguinte: que São Lino foi o segundo Papa da Igreja, logo, primeiro depois de São Pedro. Foi, da longa série de Papas que estão sepultados no Vaticano, o primeiro que foi juntar-se a São Pedro ali, como foi o primeiro Papa que foi ao Céu depois de São Pedro. Então, ele diz que quase nada se sabe dos primeiros Papas.

De São Lino, mesmo pelo que ele diz aqui, ele é festejado como mártir, mas parece que não se sabe bem como é que foi o martírio dele, nem nada. Então levanta-se o problema de saber o que dizer deste Santo, uma vez que nossa piedade tem que saber dizer algo de cada Santo que está no Céu. E a resposta que ele dá é muito bonita.

Afirma ele: quanto maior é a carga que um monumento precisa suportar, tanto maiores são os fundamentos que estão sob a terra. De maneira que, ainda que não se vejam os fundamentos, pelo tamanho do monumento, a gente calcula como são eles. Assim também com os primeiros Papas da Igreja. Há muita obscuridade, os fatos são muito antigos, a Igreja estava em regime de perseguição, portanto, todo sistema de anotar, de registrar, de conservar a memória, dados biográficos do Papa, era todo um sistema que ainda não estava organizado. Entretanto desde aquele tempo os fiéis veneravam a São Lino como Santo. E então ele faz parte daquela longa série de Papas Santos que se seguiram a São Pedro, e que constituem o fundamento do Pontificado.

Portanto nossa confiança repousa sobre esta razão para compreender bem que ele deve ter sido um varão de uma santidade eminente, e para lhe tributar todo respeito, toda a veneração que a um santo se deve ter.

Esta consideração é muito bonita, porque impregnada de confiança na Igreja Católica, sem esse criticismo histórico bobo, quando não tem o documento nas mãos não acredita em nada, o que não é outra coisa senão uma expressão da ininteligência, da “quadratura” (= espírito geométrico) e da falta de bom espírito. Mas, pelo contrário, é uma atitude superiormente cheia de Fé e superiormente inteligente. Em suma, é aceitar a santidade de São Lino pelo lado dos imponderáveis que são esses que Dom Guéranger tão bem enunciou.

Então, com um ato inteiro de confiança, dizer: “Ele era venerado como santo por aqueles, a Igreja o admitiu como santo. Ele tem que ter sido santo, porque São Lino é uma das pedras vivas desta longa série de Papas todos santos, que houve consecutivamente a São Pedro. Então foi santo mesmo e nós, cheios de confiança, cheios de um senso católico arquitetônico, lhe prestamos a nossa homenagem, a nossa veneração”.

Este é um modo de raciocinar que indica um espírito, o qual, por sua vez, indica como devemos nos portar em face das situações e fatos da Santa Igreja. Quer dizer, as coisas da Igreja têm muito frequentemente algo de um pouco misterioso, algo de lusco-fusco que é inerente a tudo quanto é muito altamente verdadeiro. As verdades muito clarinhas, muito lisinhas, muito demonstradinhas, muito palpaveizinhas são estrelas de segunda grandeza do firmamento das verdades. As grandes estrelas são as que se percebe que são verdadeiras, mas que por vezes têm uma certa dificuldade em demonstrar de um modo direto; porém, com argumentos colaterais, por toda uma série de circunstâncias, por motivos arquitetônicos, o católico crê. Isto é superiormente crer. E é isto que se deve realmente desejar, é essa atitude que se deve tomar em face de inúmeros fatos e situações da Igreja Católica.

Digo isto porque os senhores vão se encontrar talvez dentro de não muito tempo diante de um problema: estamos nesta espécie de reforma geral das coisas da Igreja e há modernistas que levantam dúvidas quanto à existência ou quanto à santidade deste ou daquele santo, não propriamente canonizado pela Igreja, mas admitido pela Igreja como santo por causa da veneração dos séculos.

Eu acho que o bom espírito é fazer como Dom Guéranger: se foi venerado como santo durante séculos por toda parte, por isso mesmo existiu e foi santo. E é contra o senso católico bom, é contra o verdadeiro senso das proporções por isso em dúvida. Está no Martirológio, existiu e foi santo. Esse é o bom senso.

Essa posição de alma interessa muito mais do que a explicação sobre São Lino. É o entender com que tacto, com que senso do claro-obscuro, que é o maior senso da inteligência e da Fé, estas coisas todas devem ser tratadas e abordadas.

Nota: Para aprofundar o tema, vide o artigo do Prof. Plinio "O laicismo dos estados roubou à sociedade moderna o sentir da Igreja" (Catolicismo, N. 79, Julho de 1957).


Bookmark and Share