Plinio Corrêa de Oliveira

 

Na humilde Casa de Nazaré, uma contínua ascensão em graça e santidade das três pessoas excelsas que lá moravam

 

 

 

 

 

 

Santo do Dia, 2 de novembro de 1992

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A D V E R T Ê N C I A

Gravação de conferência do Prof. Plinio com sócios e cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor.

Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá Dr. Plinio em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.


 

Eu passo agora a uma outra consideração. Essa consideração vai talvez causar uma certa surpresa aos Srs. pelo modo pelo qual eu vou entrar no assunto. Mas em todo o caso eu tenho a esperança de que lhes agrade, sobretudo de que lhes faça bem.

Nunca dei muita importância a que o que digo lhes agrade, mas que os Srs. aceitem, que façam disso a sua convicção razoavelmente adquirida com as luzes da Fé e que vivam em função disso, aí está exatamente o ponto essencial da minha preocupação e de meu dever. Eu vou aqui entrar pelo assunto e vai surpreendê-los um tanto.

 

* Diz o Evangelho que o Menino Jesus crescia em graça e em santidade perante Deus e ante os homens

Diz o Evangelho que o Menino Jesus crescia em graça e em santidade perante Deus e ante os homens. Eu não tenho boa memória, eu não posso garantir exatamente cada uma dessas palavras, mas o sentido é esse.

Nós devemos tomar em consideração tudo quanto é Nossa Senhora. Quer dizer, é um tal acúmulo de perfeições criadas, que creio que foi Pio IX que disse que dEla se pode dizer tudo em matéria de elogio, desde que não se diga que Ela é Deus. Desde que não se diga que Ela é Deus, pode-se dizer tudo, porque tudo cabe em relação a Ela.

Se é verdade que o Menino Jesus – que era o Menino Jesus! – crescia em graça e santidade perante Deus e perante os homens, é que nEle havia o que crescer. De qualquer natureza que fosse esse crescimento, ele é um crescimento da perfeição perfeitíssima para algo que, se era crescimento, era uma perfeição ainda mais perfeitíssima.

Não vejo como elidir este raciocínio.

* Ao lado do Menino Jesus, Nossa Senhora, que era confirmada em graça, também crescia de ponto em ponto constantemente

Nós temos então que, ao lado dEle, Nossa Senhora, que era confirmada em graça, portanto não podia pecar, não podia cair na mais leve falta porque Ela estava garantida por Deus contra isso, Ela estava confirmada em graça, Ela foi concebida sem pecado original e confirmada em graça desde o primeiro instante de seu ser, e que, portanto, também Ela não tendo defeitos – e o importante da consideração está nisso – Ela crescia de ponto em ponto constantemente. Ao lado deles estava São José.

É difícil a gente fazer um elogio de qualquer homem, de qualquer grandeza terrena, depois de ter lembrado a grandeza de São José. O homem casto, virginal por excelência, descendente de David. E nos diz São Pedro Julião Eymard numa das suas conferências – ele não cita o documento, mas ele afirma – que era o Chefe da Casa de David e o pretendente legítimo ao trono de David, ocupado, derrubado, com Israel dominado pelos falsos reisinhos dos reinos em que se tinha dividido e dominado pelos romanos. Mas o pretendente legítimo era ele.

Quando Nosso Senhor entrou em Jerusalém no Domingo de Ramos o povo O aclamava: "Ave Jesus filho de David, filho de David!" Faz realmente pensar em que Ele era o filho de David por excelência. David tinha muitos descendentes, mas filho de David por excelência era Ele.

São José era, portanto, o pretendente ao trono na Casa de David, era varão tão perfeito que o Espírito Santo o modelou para ter proporção com Nossa Senhora.

Os Srs. podem imaginar o que isso representa? Nossa Senhora uma mera criatura, mas que chegou na ordem do criado a uma tal altura, que dEla só não se pode dizer que é Deus, todo o resto se pode dizer.

Como é o homem que é formado pelo Espírito Santo para estar na proporção de sua esposa? A que altura, a que píncaro esse homem deve ter chegado? Não se pode exprimir, as palavras humanas não podem exprimir.

* Na humilde Casa de Nazaré, a cada instante havia uma ascensão em graça e santidade das três pessoas excelsas que lá moravam

Mas, também é verdade que também ele – eu pessoalmente não tenho dúvida nenhuma – era confirmado em graça. Então, na humilde Casa de Nazaré, que depois os Anjos levaram para Loreto, na Itália, o fato [era] que havia uma ascensão em graça e santidade das três pessoas excelsas que moravam lá, e que a todo o momento que se passava... Se naquele tempo houvesse relógio capaz de dar tic-tac, a gente diria que em todo tic-tac, aquelas três pessoas cresciam em graça e santidade perante Deus e perante os homens.

Em certo momento a Providência leva São José. É o padroeiro da boa morte porque tudo leva a crer que Nossa Senhora e Nosso Senhor assistiram a morte dele e o ajudaram a morrer. Não se pode ter idéia de uma morte melhor do que a morte de São José, uma morte admirável, perfeita.

Então, ao lado de São José estava Nossa Senhora, estava Nosso Senhor, ajudando a levar, até ao último momento, a sua alma àquela perfeição pinacular para a qual ele fora criado. Que não era a perfeição de Nossa Senhora, era uma perfeição menor. Ele, se chegasse ao extremo de sua perfeição, ele chegaria a uma altura menor do que a de Nossa Senhora, mas era a perfeição enorme para a qual ele fora chamado. [Estava] Nossa Senhora, a cada momento subindo a uma perfeição maior. Não se sabe o que dizer, só os Anjos poderão cantar no Céu para nós aprendermos o que é que é essa perfeição maior, e, por cima disso, super-eminentemente, Nosso Senhor também numa perfeição maior.

* Uma ascensão contínua que foi o encanto de Deus e dos homens na humilde Casa de Loreto

De maneira que São José, quando o seu olhar embaçado já ia se apagando para a vida, olhando para a sua Esposa, olhando para Aquele que juridicamente era seu filho – porque ele tinha um direito paterno sobre o fruto das entranhas de Maria, juridicamente ele tinha poder de pai sobre o Menino Jesus –, ele, ainda nos últimos instantes, percebeu aquilo que foi o enlevo dele a vida inteira: ver aqueles dois subirem, subirem, subirem. E ele vendo-Os subir, por sua vez subia, subia, subia.

Essa ascensão contínua foi, a meu ver, o encanto de Deus e dos homens na humilde Casa de Loreto.

De tal maneira essa reflexão – que eu fiz enquanto essa cerimônia tão generosa e tão bonita se desenrolava – me encanta, que eu que sempre tive desejo de ir à Casa de Loreto, mas por essas ou aquelas razões não tive tempo de ir, não tive meios de ir, não fui, formei aqui nesta reunião o propósito de ir à Casa de Loreto, ajoelhar-me – qualquer que seja a dificuldade daí decorrente – e oscular o chão daquela Casa, pensando em Jesus, em Maria e em José. Mas pensando em Maria, Jesus e José especialmente daquele ângulo: três perfeições que chegaram todas ao auge ao qual cada uma devia chegar.

* Uma hierarquia com uma ordem admiravelmente inversa e que faz amar ainda mais as riquezas e as complexidades de toda a ordem verdadeiramente hierárquica

Sendo que, entretanto, esses auges não eram iguais, eram desiguais. Eram três auges desiguais que se amavam intensamente, que se intercompreendiam intensamente, e em que a hierarquia que Deus quis até ali, [era] uma hierarquia com uma ordem admiravelmente inversa: aquele que era o chefe da casa no plano humano era o que era menos na ordem sobrenatural, o que era o Menino e que deveria obediência aos dois era Deus...! Eu não tenho que dizer mais nada, quer dizer, era uma espécie de inversão. Inversão que faz amar ainda mais as riquezas e as complexidades de toda a ordem verdadeiramente hierárquica.

Então, [eu quero] ir lá e venerar esse princípio das hierarquias, das perfeições, que não é por nenhum defeito humano, por nenhuma fraqueza humana, mas por mero desígnio de Deus. Eram perfeições altíssimas, admiráveis, mas desiguais, realizando uma harmonia de desigualdades admirável como não houve no resto da terra jamais uma coisa igual, e ali dando lugar a que toda a alma fiel que quisesse fazer uma reflexão sobre esse assunto, pudesse começar o hino de grandeza, de admiração e de fidelidade a todas as hierarquias e todas as desigualdades.

Essa ordem, esse sumo de hierarquias, os Papas o lembram várias vezes e isso vem descrito no livro que pelas mãos augustas de Dom Bertrand e depois de DomLuís me foi oferecido essa noite.

* Os únicos cortesãos à altura de uma Casa onde nasceu um Deus são os Anjos no Céu

Estas hierarquias, Deus as quis assim. Leão XIII mostra especialmente que Deus quis outro mistério dessas complexidades nobilíssimas da ordem hierárquica: Ele quis que São José fosse o representante da Casa mais augusta que houve na Terra. Porque nas outras Casas, a Casa de Bragança, a Casa de Habsburgo, quantas outras Casas, são casas ilustres porque nelas nasceram reis. O que dizer da Casa onde nasceu um Deus? Os únicos cortesãos à altura de uma Casa onde nasceu um Deus são os Anjos no Céu. Evidentemente.

Ele quis ao mesmo tempo que este chefe da Casa de David fosse trabalhador manual, fosse carpinteiro. E até quando essas circunstâncias é lembrada no Evangelho, é alguém que olha para Nosso Senhor, vê o papel que Nosso Senhor está fazendo e diz: " Non est hic filii fabri? Este aqui não é o filho do carpinteiro?" – como quem diz "homem que não vale nada, não é nada, não representa nada".

Nosso Senhor quis exatamente que as duas pontas da hierarquia temporal se ligassem naquele que é o Homem-Deus. A natureza humana e divina estão ligadas em Nosso Senhor, e a condição de Príncipe pretendente Ele mesmo à realeza da Casa de Israel. Isso talvez nos faça compreender bem aquela insistência dos Apóstolos [de] quando é que viria o reino dEle, porque Ele tinha o direito de ser rei.

Eles, aliás, pareciam desejar isto com cupidez, para ter lugares importantes, mas a pergunta era essa.

* O Criador-criatura e Rei-operário reunia os extremos para reforçar a coesão dos elementos intermediários da hierarquia

De qualquer maneira a coincidência desta perfeição com a perfeição do operário no outro extremo oposto da classe social, em ambos os aspectos – criador-criatura, em aspecto incomparavelmente menor, rei-operário – reunindo os extremos para reforçar a coesão dos elementos intermediários da hierarquia e unindo os elementos intermediários da hierarquia pela união dos pontos extremos.

É como quem aperta, vamos dizer um pouco prosaicamente, uma sanfona dos dois lados, comprime aquela parte intermediária e faz com que fiquem inteiramente juntas. A hierarquia nos aparece aqui não mais só como um conjunto de cimos tão altos que a nossa vista física e a nossa vista mental custam a alcançar tudo quanto isso representa, [mas] representa também um amplexo hierárquico, um amplexo desigual, mas afetuoso, da ordem social inteira. De maneira que o que está mais alto abraça afetuosamente o que está mais baixo e diz: "Na natureza humana todos nós somos um".

Eu tentarei abreviar porque está ficando tarde, quinze para a meia-noite, eu espero terminar logo.

* Após a morte de São José e a partida de Nosso Senhor para sua vida pública, Nossa Senhora fica sozinha em Nazaré, rezando e recordando o passado

Na ordem do pensamento, da cogitação, morre São José – como eu dizia. Depois vem o momento duro da despedida de Nosso Senhor em relação a Nossa Senhora, Ele vai começar a sua vida externa, a sua vida pública. Ele tinha vivido trinta anos com Ela.

Os Srs. podem imaginar o que é o afeto de Mãe ardentíssimo dEla para com Ele, a adoração dEla para com Ele, e o hábito que se junta a isto? Os Srs. já podem imaginar a primeira noite de vazio da casa de Nazaré depois que Nosso Senhor foi embora também? Sendo que Nossa Senhora sabia, pela profecia de Simeão, que um gládio havia de atravessar o coração dEla. Ela entendeu bem que aquilo era uma coisa com o Filho divino dEla, e, portanto, aquilo lhe foi muito mais dolorido do que se Ela soubesse que era uma coisa com Ela. Ela percebeu que Ele partiu para aquilo que nós poderíamos chamar a tragédia se não fosse o épico da glorificação final.

Ele partiu para a tragédia e Ela ficou sozinha, São José no Limbo, Ele entregue às feras, começando a Sua vida que havia de terminar como nós sabemos.

Na humilde Casa de Nazaré uma janela aberta, pela janela entrando o luar, e Ela sentada, sozinha, no escuro, talvez nem sequer uma candeia acesa, rezando intensamente e lembrando.

Mas lembrando o quê? Lembrando o passado.

Para Ela o que é que tinha graça a não ser lembrar o passado e pensar no futuro que era a Crucifixão do Menino Jesus... na Crucifixão de Nosso Senhor.

Eu estava pensando noutra coisa. Que freqüentemente nos presepes o Menino Jesus aparece com os braços abertos para simbolizar a cruz em que Ele haveria de ser pregado.

Ela deveria ter noção de tudo isto exatamente ou quase exatamente, e Ela pensava em tudo isto. Mas fora disso, saber um fuxico na aldeia de Nazaré, o que aconteceu, qual é o próximo funcionário romano que ia governar a província, a política do lugar, essa coisa que talvez por condescendência, por bondade para poder atrair uma alma Ela ouvisse com uma espécie de atenção, mas não era tema para Ela, absolutamente.

Qual era o tema? O tema era aquela ascensão, aquela ascensão, aquela ascensão, que Ela viu continuamente e que Ela contemplou da seguinte maneira: qual é o modo pelo qual cada um deles considerava a sua própria ascensão? Porque eles sabiam que estavam se santificando. Nosso Senhor então nem se fala, mas São José também sabia que estava se santificando, sabia que estava subindo. E, inevitavelmente, ele pensava em tudo quanto havia de bom nele no começo, depois como aquilo foi progredindo, em que estado ele estava e ia vendo até que ponto ele ia subir. De maneira tal que provavelmente ele pressentiu a morte quando notou que ele estava tal que não cabia mais perfeição nele.

Vamos pensar um pouco em São José, pensando nas formas antigas de sua perfeição, quando ele, Nossa Senhora e o Menino Jesus entraram naquela casinha, se instalaram lá, e os primeiros momentos de vida naquela casinha.

Vamos pensar em Nossa Senhora, morto São José, ausente Nosso Senhor, pensando Ela mesma em tudo isso. Pensando naqueles graus de perfeição menor que tinham ficado para trás, e quão para trás, mas que Ela amava tanto, que Ela considerava com um sorriso. Aquelas perfeições em que o Menino Jesus tinha crescido, mas que Ela tinha conhecido, por assim dizer, a palavra é incorreta, pequeninas.

Eu só digo “pequeninas” porque Ele era pequenino quando se tratava das perfeições, porque eram perfeições fulgurantíssimas.

Talvez sorrindo comprazida em tal episódio, em tal coisa assim, em tal circunstância, e depois a reação de São José como foi e também Ele depois como cresceu. Percorrendo várias vezes no seu espírito e no seu coração aquela gama de perfeições que Ela os tinha visto subir, pensando Ela mesma – é inevitável – nas várias perfeições pelas quais Ela tinha subido rumo à perfeição maior.

 

Para aprofundar o magno assunto da transladação miraculosa da Santa Casa pelos Anjos, consulte ou adquire a obra acima de autoria de Federico Catani, publicada no Brasil em julho de 2020, cuja versão original em italiano, estampada em junho de 2018, teve mais de 50.000 exemplares difundidos

 


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