Santo do Dia, 1° de abril de 1970
A D V E R T Ê N C I A
Gravação de conferência do Prof. Plinio com sócios e cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor.
Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:
“Católico apostólico romano, o autor deste texto se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto, por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.
As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá Dr. Plinio em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.
Dias atrás fiz uma exposição no Santo do Dia, a respeito da “Bagarre” [realização das promessas de Nossa Senhora em Fátima, em uma breve explicação, n.d.c.], e me chegaram aos ouvidos alguns comentários a respeito dessa exposição. Também recebi algumas perguntas de esclarecimentos sobre o assunto que me levam a tratar da questão mais uma vez.
Uma delas da qual eu acho que posso tratar em poucos minutos é a seguinte, é uma pergunta que se formula assim: se o fato de a pessoa não ter pressa que venha a “Bagarre” contém uma malícia especial, uma maldade especial, de maneira tal que comporte um particular sofrimento durante a “Bagarre”? Em caso afirmativo qual é essa maldade? Qual é essa malícia? No que consiste?
Eu acho que é uma coisa que se pode, salvo as perguntas que os senhores tenham a fazer, é uma pergunta à qual se pode dar uma resposta rápida.
Os senhores imaginem que eu estou sentado, mas cada um dos senhores se ponha nesta posição que os senhores estão sentados, num local, por exemplo, extremamente incômodo. Ali, por exemplo, sofre fome, sofre excesso de calor, começa a se sentir queimado em várias partes do corpo, tem a impressão que os olhos vão saltar, que vai morrer de um derrame, etc.. Enfim, precisa urgentemente ser socorrido de um lado.
Agora, de outro lado, o socorro depende de uma pessoa que está do outro lado de fora e que poderia pelo menos manifestar pressa em fazer cessar essa aflição. Essa pessoa não se manifesta apressada de fazer cessar essa aflição, pelo contrário, manifesta-se indolente na previsão do esforço que ela terá para fazer isso, do risco que ela terá de correr, ela então não tem pressa por causa disso.
Os senhores aceitam esse como um amigo? Os senhores diriam: “Esse homem é meu amigo?” Compreenderam bem a pergunta ou querem que eu a formule melhor? Quem quiser que eu formule melhor, tenha a bondade de levantar o braço. Em que ponto eu devia formulá-la melhor? No geral da pergunta?
O caso concreto eu acho que está bem claro, não é? Eu estou numa situação sumamente incômoda, do lado de fora está alguém que pode fazer algo para me libertar, mais ou menos, mas pode fazer algo para me libertar, mas terá que fazer alguns sacrifícios grandes para conseguir minha libertação. De medo desses sacrifícios essa pessoa se manifesta indolente em me libertar porque não quer ir de encontro aos sacrifícios que tem de fazer. Então a pergunta é: esta pessoa pode ser considerada minha amiga? Eu considerarei esse indivíduo como meu amigo? Esta é a pergunta.
A resposta não pode deixar de ser: não! Se eu for libertado e esse sujeito vier a meu encontro: “Oh Plinio, há quanto tempo eu não o vejo?”
Eu digo: “Fora daqui! Suma da minha presença se não quer que eu o esbofeteie já, e entregue aos verdugos. Como é esse negócio?! Você poderia sofrer algum incômodo para me libertar a mim e você não faz nada e depois vem se apresentar como meu amigo? Suma daqui!” É o que qualquer um de nós faria. Nós não podemos aceitar isso como amigo, mas como farsante, evidentemente.
* “Para não me expor aos incômodos da “Bagarre”, eu prefiro que a Igreja sofra as vergonhas, as humilhações, os abandonos, as traições, as infiltrações, as negações que entenda…!”
Ora, a Igreja está na situação em que está a pessoa em que eu acabo de descrever, acabo de imaginar. Ela está passando por toda espécie de tormentos, isso é óbvio.
Agora, eu, Plinio Corrêa de Oliveira, para não me expor aos incômodos da “Bagarre” não tenho pressa que venha a libertação da Igreja. Antes, prefiro nem pensar no caso de alguém A libertar, quando eu sei que só através da “Bagarre” ela pode ser libertada. Eu pergunto: eu sou bom filho da Igreja? Isto é ser bom filho?
Então, a Igreja que sofra o que quiser as vergonhas que entenda, as humilhações, os abandonos, as traições, as infiltrações, as negações, eu sei que o desfecho normal disto é a “Bagarre”, mas eu não quero, porque imagine os incômodos que eu vou ter! Quanto eu vou ter de passar fome, quanto eu vou ter de andar a pé, vou correr o risco de minha preciosa pele, então não quero!…
Isto é um filho da Igreja? Qual é a malícia, qual é a maldade de que há nessa atitude? A maldade que há nessa atitude é a seguinte: é eu preferir-me a mim à Igreja Católica. É isso, pura e simplesmente. Quando eu devo amar a Deus sobre todas as coisas e, portanto, a Igreja Católica sobre todas as criaturas, eu não amo. Há uma criatura chamada eu, que eu coloco infinitamente acima da Igreja Católica…
Agora, é evidente que isso traz consigo uma forma especial de maldade. Qual é a maldade? Vamos pensar só nisso: as milhões de almas que vão indo para o Inferno por causa do adiamento da “Bagarre”, mas são milhões, e que durante toda a eternidade vão ter um tormento horroroso. Eu quero, eu prefiro que isto continue a ser assim a eu passar fome, frio, sede e riscos. Isto tem propósito?
Para salvar uma daquelas almas Nosso Senhor Jesus Cristo teria morrido na Cruz, mas eu me dou a mim mesmo por tão valioso que eu não quero isto para mim. Pronto, está acabado!
* Um exemplo para se compreender os sofrimentos do Purgatório
Bem, vamos pensar noutra coisa. Vamos pensar nas almas que vão para o Purgatório. Quantas almas cometem pecados especialmente graves que lhes merecem o Purgatório por causa da atual situação. O Purgatório é fogo, fogo que arde no duro! É verdade que queima a alma, mas produz um tormento maior do que se queimasse o corpo, porque o que atinge a alma é mais vital do que o que atinge o corpo.
Então, uma alma passar por exemplo, dez anos no Purgatório, aqui a gente tem a impressão de um purgatorinho. Imagine-se passar dez anos fritando as respectivas carnes e ossos numa fritadeira imensa… é isso.
Eu acho que lhes contei aqui a visão de uma venerável… de uma rainha da Espanha que tinha morrido há pouco e apareceu a ela vestida com todos os trajes de corte, e todos os trajes eram fogo, e ela perguntou à rainha por que era aquilo.
Diz a rainha: “Porque entraram no reino modas mundanas – olhem, não eram modas imorais hein – modas mundanas que não eram da antiga tradição hispânica. E eu não favoreci, porém não me opus. Se eu tivesse favorecido estava no Inferno, como não me opu,s estou no Purgatório”.
Isso depois de terem mandado celebrar em toda a vastidão do império espanhol que compreendia naquele tempo a Espanha e Portugal e todas as colônias espanholas e portuguesas, e Itália, e quanta coisa há, missas por alma da rainha. Nada adiantou. E a rainha foi para o Purgatório e apareceu com os trajes de corte todos em chamas. Simplesmente porque ela não se opôs às modas imorais.
* Quanta gente vai para o Purgatório hoje em dia! E eu prefiro que isto continue a que eu tenha o dissabor de sair de minha vidinha…!
Agora, eu pergunto aos senhores para falar de Purgatório e não de Inferno: quanta gente vai para o Purgatório hoje em dia? Porque, entre as modas mundanas da rainha e a minissaia, a distância é abismática, simplesmente. Está bem, agora então eu pergunto: quanta gente vai para o Purgatório? Eu prefiro que isto continue a que eu tenha o dissabor de sair de minha vidinha…!
Agora, isso não tem uma maldade especial? Se eu visse durante a noite, não sei, um bicho qualquer machucado gemer à noite inteira junto à minha janela, isso me incomodaria o sono e no total era capaz de ajudar o bicho. Uma alma no Purgatório, milhões de almas no Purgatório fritando num tormento horrível, não me incomoda… “Eu quero a minha vidinha, por isso a “Bagarre” que demore”.
Isso não tem uma maldade especial dentro disso? Se não tem, eu pergunto: o que é maldade? Qual é o conceito de maldade? Se isso não tem uma maldade especial, qual é o conceito de maldade? Eu não conheço. Então estamos completamente desentendidos, nosso vocabulário é outro.
Bem, tudo isto não é nada perto do seguinte: Nossa Senhora é ofendida, Nosso Senhor é ofendido, a Igreja Católica como instituição, Corpo Místico de Cristo é ofendido barbaramente, e que é mil vezes pior do que estarem as pessoas fritando no inferno ou no purgatório, mas eu não quero porque eu não quero deixar a minha vidinha…!
O que dizer de um tipo assim? Esse é um tipo, não é? É um descarado! O que dizer deste descarado? Que ele é um descarado, está acabado, não tem outra coisa para dizer.
Alguém me dirá: “Mas Doutor Plinio, não tinha feito esta reflexão”.
Eu digo: “Então é uma outra forma de descaramento, porque conhecendo essas verdades da Fé nunca ter raciocinado a respeito disso, que é tão evidente, que é tão imediato, é de uma indolência, de uma preguiça, de uma indiferença que toca as raias de não sei do quê. É isso. Porque isto é evidente, é imediato, salta diretamente dos dados da Fé. Salta, salta aos olhos. Então por que deixar, não ter pensado nisso?
Vontade de dizer: “Me faça a lista das coisas em que você pensou. Você pensou alguma vez na sua vida? Em si eu sei, mas no que mais? Vamos ver isso de frente, diretamente, como é que é?” Para dizer a verdade nua e crua é esta e não é outra.
Para uma pessoa nessas condições, está no caso de ir ser uma pedra angular do Reino de Maria? O Reino de Maria pode fazer-se com gente assim? Simplesmente sob pretexto de que não está em estado de pecado mortal? Ou é o reino da tibieza é que [se] faz assim? É o reino da tibieza, evidente! Quer dizer, ou essa pessoa muda inteiramente ou não pode entrar no Reino de Maria.
Agora, como é que a gente muda isso sem muito sofrimento? Não há meio. Então, resultado: há uma maldade especial, e precisa haver um castigo especial nisso.
* Resposta à objeção: como eu não me sinto preparado para a “Bagarre” eu não posso querê-la
Alguém me objetará, e com isso eu concluo o Santo do Dia: “Mas Doutor Plinio, eu não me sinto preparado para a “Bagarre” e como eu não me sinto preparado, eu não posso querer”.
Eu poderia apresentar contra isso dois argumentos. O primeiro argumento é um argumento lógico, com toda a força da lógica: “Então prepare-se!” Está acabado. “Não estou preparado”! “Prepare-se”.
É a mesma coisa que, eu estou, por exemplo, penando num cárcere e está um amigo do lado de fora e me diz: “Dr. Plinio, eu não tiro o senhor daí porque eu não estou preparado ainda para esse sacrifício”. “Então prepare-se! Não vê que eu estou sofrendo aqui e você é meu amigo?… Prepare-se!”
* Oração pedindo a vontade que venha logo a “Bagarre”
Bom, há um argumento que é mais bondoso, em que a lógica se mitiga com a misericórdia, e é o seguinte: faça uma oração a Nossa Senhora que é a seguinte:
“Ó minha Mãe, dai-me a vontade de que venha logo a libertação da Santa Igreja e preparai minha pobre alma para o momento em que venha a libertação. Vós que com uma simples prece obtiveste a transmutação da água em vinho em Canaã, podeis mudar-me num instante. Ó Coração Sapiencial e Imaculado de Maria, fazei em mim a Vossa obra, preparai-me desde logo para a “Bagarre””.
Eu pergunto se está claro ou não está claro. Alguém quer fazer alguma pergunta? O que é que eu dou? Dou o esquema ou o exame de consciência? Bem, o exame de consciência é:
I – Olhando-me de frente: é bem verdade que eu vou reler o que eu anotei?
II – É bem verdade que eu vou rezar para aproveitar o que eu reler?
III – Meu propósito de reler essa anotação é firme, com dia e hora marcada? Ou é uma veleidade platônica, que não se sabe para quando?
IV – Depois de ter relido, eu me deverei fazer as seguintes perguntas: Eu tenho alguma objeção consciente ou subconsciente a isso? Qual é?
V – Resolução: apresentar no Santo do Dia essa objeção para ser respondida.
VI – Verificada minha culpabilidade em face disso, eu peço contrição, vergonha, emenda? Que orações determino fazer a esse propósito?
VII – Tenho confiança no poder milagroso de Nossa Senhora para curar as almas?
VIII – Tenho em vista que Nossa Senhora é o “Refúgio dos pecadores” e que quanto mais eu me sinto pecador, tanto mais Ela me é Refúgio? Sei evitar assim o desânimo e esperar tudo dEla?
São as perguntas feitas.
* Três jaculatórias para pedir ajuda contra o desânimo
(Sr. Ezcurra: Uma das tentações mais frequentes é o desânimo, não poderia dar o senhor uma jaculatória que seja contra o desânimo, quando…)
Pode perfeitamente, depende um pouco da psicologia e da via espiritual da pessoa a quem esta jaculatória é sugerida. Há alguns que se sentem mais propensos e mais auxiliados contra o desânimo pensando na misericórdia de Nossa Senhora. Eu creio que aí se combinam maravilhosamente as três jaculatórias: “Refugium Peccatorum” (Refúgio dos pecadores), “Consolatrix Aflictorum” (Consoladora dos aflitos) e “Auxilium Christianorum” (Auxílio dos Cristãos).
Elas se combinam, formam um todo. Quer dizer, é porque Ela é Refúgio dos pecadores, que eu confio nEla. Então não há razão para desânimo, porque se fosse confiar porque eu sou bom, está bem, então não tem nada feito. Mas se é para confiar porque eu sou pecador, é o meu caso! Se há quem esteja no caso de se dirigir a Ela, sou eu, não é o Refúgio dos pecadores? Então lá vou eu! é o meu lugar próprio, onde eu posso estar refugiado, estar bem.
Depois, Consolatrix Aflictorum. Nossa Senhora é Consoladora inclusive do pecador aflito, que tem aflição pelo seu pecado. Ela consola de que maneira? Dando a esperança da cura, dando a esperança de que ele se modifique.
Auxilium Christianorum: se eu tenho de fazer nisso alguma força e me sinto muito mambembe, muito fraco, aí está Ela para auxiliar. Para isso Ela é Auxiliadora. É Auxiliadora dos fracos, dos mambembes, dos que não têm energia, dos pobres coitados. Não é isso?
Então essas jaculatórias se combinam porque Ela é Refúgio, é Consoladora, e é Auxílio, ajuda, Ela portanto resolve o caso. Qualquer caso por mais intrincado que seja é resolvido por Nossa Senhora.
Eu acho que estas três jaculatórias, que se não me engano, aliás, ficam juntas uma da outra na Ladainha Lauretana se conjugam, dão uma espécie… elas se constituem uma ladainha dentro da ladainha, elas constituem um todo dentro do todo, e devem estar muito presentes no nosso espírito, segundo eu entendo. Eu rezo essas jaculatórias e frequentissimamente, mas frequentissimamente.
Eu acho excelente e não acho nada melhor, eu não sei em matéria de piedade, nada de melhor do que a gente se aproximar de Nossa Senhora como pecador que pede auxílio dEla, e se refugia junto a Ela, porque aí por mais perturbado que a gente esteja, estamos no nosso caso, Ela auxilia sempre!
Eu até nem compreendo como se possa viver sem isso, eu não entendo a vida sem isso.
* Oração pedindo a Nossa Senhora que nos dê força para agir
Bem, há outro gênero de almas que prefere mais uma jaculatória em que pede força a Nossa Senhora, mais pede que Ela nos dê força para agir, do que pede que Ela aja por nós. É uma via espiritual. Aí nós poderíamos pedir a Nossa Senhora assim: “Ó Vós que no mundo inteiro esmagastes não só todas as heresias, mas todos os vícios e todos os pecados, dai-me forças para travar dentro de minha alma o bom combate por vossa glória”.
Há um Santo (São Nicolau de Flue) que fazia uma jaculatória, eu dei isso num Santo do Dia, e gosto de rezar de vez em quando, é uma beleza: “Ó minha Mãe, tirai-me tudo o que de Vós me afasta e dai-me tudo quanto a Vós me una”.
É uma beleza porque em geral nós estamos separados de Nossa Senhora por coisas que nos afastam, então tirai-me. Eu abrir mão, não abro, mas tirai-me da mão. Tirai-me de dentro da mão aquilo que me afasta de Vós, dai-me tudo que une a Vós”. Eu acho isso uma beleza, eu acho isso uma maravilha.
Mas eu não quisera acrescentar à nossa vida um rito a mais que se transforma simplesmente num rito. Eu faço, portanto, o seguinte: eu sugiro que isso seja feito durante um mês e se daqui a um mês isso está a coisa meio “rotinizada” (neologismo da palavra “rotina”, n.d.c.) em excesso, a gente possa rever mais, aí eu aceito a ideia como muito boa, eu recomendo aos senhores que façam. Acho que não havendo mais perguntas podemos encerrar.
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