Plinio Corrêa de Oliveira

 

São José de Cupertino - III

Admirado por todos católicos,

no que deve ser imitado?
Seus dons sobrenaturais evocam a

atmosfera medieval

 

Santo do Dia, 26 de outubro de 1968

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A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério tradicional da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.

Para ler os "Santos do Dia" anteriores clique em

São José de Cupertino - I

São José de Cupertino - II 

            Continuaremos os comentários a respeito de São José de Cupertino, mas antes quero dar aos senhores um esclarecimento.

Devemos nos perguntar sob que ponto de vista é modelo de todos os católicos São José de Cupertino, cuja vida tão singular está sendo comentada por nós.

Sei que se pode dizer que não é vocação de todos os homens serem de tal maneira ininteligentes, desastrados, que os cacos das sopeiras e dos pratos que lhes caem da mão sejam colados no hábito e daí para diante. Então, em que sentido deve ser imitado por todos?

É lindíssimo que a Igreja Católica, Mestra em todas as virtudes, seja Mestra portanto também da sabedoria e do equilíbrio. Em outros termos, Ela indica bem exatamente em que ponto se põe o equilíbrio entre elementos aparentemente inconciliáveis, opostos, mas que, bem focalizados, encontram sua posição adequada.

A Igreja tem sido o foco que tem suscitado inúmeros santos, entre os quais se acham Papas, imperadores, reis, nobres de todas as categorias, plebeus, pessoas de uma inteligência extraordinária, etc. Como a Igreja, ao mesmo tempo, eleva aos altares um homem tão sem inteligência, tão sem valor pessoal como foi São José Cupertino? Como uma coisa se compagina com a outra?

Notamos aí o seguinte princípio: a Igreja deseja que os homens usem bem as coisas terrenas. Estas foram criadas por Deus e dadas por Ele para que os homens as usem. Mas ao mesmo tempo em que as usam, devem fazê-lo com desapego. O que equivale dizer o seguinte: a resolução de não as usar a não ser para a glória de Deus. Não as querer a não ser para isso. E sempre que for por uma mera vantagem pessoal, que não tenha em vista a glória de Deus, não querê-las.

Nisso está exatamente a virtude católica: cada homem, dispondo das coisas terrenas, sejam as suas capacidades individuais ou sejam os objetos que se encontram comumente no seu uso, que se valham delas de acordo com o plano da Providência Divina. E, em caso contrário, não as usem.

            No Convento da Luz, na Avenida Tiradentes, em São Paulo – onde com uma certa freqüência vou assistir a Missa –, acha-se a sepultura de Frei Galvão (hoje canonizado, n.d.c.), franciscano fundador daquele convento. Em seu epitáfio, estão essas lindas palavras: “animam suam in manibus suis semper tenens, placide obdormivit in Domino die 23 decembris. Anno 1822” (tendo ele sempre em suas mãos a sua alma, entregou-a placidamente ao Senhor).

Ou seja, é uma alma exatamente nas mãos daquele com a qual ela se identifica, um homem que sempre quer o que deve querer e não quer o que não deve querer. E cuja vontade governa a sua santíssima alma inteiramente. Alma santíssima por causa disso. E uma alma assim, quando ela pode estar revestida de todas as glórias do mundo, de todas as pompas, de todas as riquezas, ela “animam suam in manibus semper tenens”. Ter a sua alma na mão, com moderação, com sabedoria, que não se apega a nada. Se for preciso, abandona qualquer coisa e até prefere abandonar a ter.

A Igreja – para que os homens sejam capazes de cumprir bem essa obrigação de dispor das coisas terrenas – suscita santos que renunciam completamente aos bens terrenos. Exatamente por essa renuncia, eles obtêm graças, dão bons exemplos, criam um ambiente que coloca todo o valor das coisas deste mundo no seu devido ponto, como nada são, em última análise, aos olhos de Deus.

Os senhores imaginem uma sociedade como a medieval, uma sociedade possante e harmonicamente hierarquizada, com imperadores, reis, príncipes, senhores feudais, com prelados, eclesiásticos de alta sabedoria, grande sábios, uma sociedade em que o prestígio é um bem e está distribuído largamente por todas as camadas sociais. Os senhores imaginem uma sociedade que vai se enriquecendo cada vez mais, como a medieval. Era preciso um contrapeso a tudo isso. E tal contrapeso era dado por pessoas que renunciavam a tudo, ao pé da letra. E que por seu exemplo ajudavam os que não eram chamados a renunciar a tudo, mas serem interiormente  desapegados do que tinham.

Então os senhores têm que imaginar uma cidade de estilo medieval em que  passa São José de Cupertino, santo famoso pela sua ininteligência e incapacidade, de tal modo que as multidões acorrem à sua procura. E numa outra ruela da mesma cidade está caminhando, por exemplo, um professor universitário. E os estudantes, como faziam naquele tempo com os professores, colocando suas capas no chão para o professor passar em cima, porque tinham ficado entusiasmados com a aula que acabara de lhes ministrar... Que lição para o professor inteligente ver a glória de São José de Cupertino e compreender que toda a glória de sua inteligência não era nada se não fosse orientada para Deus! Porque – em última análise – só valem as coisas de Deus e a inteligência do homem que não serve a Deus não vale mais nada.

Adiante, São José de Cupertino continua a caminhar quando passa o cortejo de um nobre. Este monta um cavalo ajaezado esplendidamente, com uma série de nobres secundários que o seguem, portando o brasão de armas de sua família no escudo que ele traz, com uma porção de arautos anunciando o muito grande e muito poderoso senhor Tal que ia passar... Eram vinte, cinqüenta homens do cortejo desse nobre. Enquanto isto passam dois mil atrás de São José de Cupertino...! E quando passaram esses dois mil, o nobre também desce do cavalo, oscula o chão onde São José de Cupertino – tão burro, tão incapaz, tão feio, tão torto, tão errado, mas santo – passou. E que por isso valia mais do que ele com toda sua nobreza e riqueza. Pois São José de Cupertino possuía esse valor em comparação com o qual todo o resto é lama e lixo: ele possuía a santidade. Estava acabado!

Como isso servia, por meio de comparação, para ajudar os grandes da terra a compreenderem o que a grandeza não é e a mantê-la dentro de seus próprios limites! E, ao mesmo tempo, fazia com que a grandeza fosse bondosa, dadivosa, generosa, existindo para o bem de todos em vez de existir para mandar apenas.

Aí os senhores têm esses equilíbrios maravilhosos da Igreja.

Outro exemplo: o casamento não se manteria na indissolubilidade do vínculo conjugal se não houvesse homens e mulheres que, praticando uma santidade perfeita, não se casassem.

Igualmente não haveria gente capaz de fazer bom uso da conversa, se não houvesse outros que não se votassem ao silêncio perpétuo.

Não haveria gente capaz de fazer bom uso da  pobreza, se não houvesse ordens religiosas que se entregassem a uma pobreza completa, como, por exemplo, os franciscanos. Porque é levando, de um lado, ao último extremo a pobreza, que de outro lado se torna possível levar ao último extremo a riqueza. O rico será equilibrado na posse de sua riqueza e fará dela um uso benfazejo, desde que veja o exemplo daquele que renunciou às coisas que estão em suas mãos.

O homem sociável, brilhante, que reúne uma grande roda em torno de si, que tem um salão frenquentadíssimo, a dona de casa que é um dos centros da vida social de sua cidade, poderá fazer bom uso desse prestígio se tiver perto de casa um convento de freiras que quase nunca falam.

Assim, levando as coisas a extremos harmônicos, a Igreja obtém aquele equilíbrio maravilhoso de que Ela é verdadeira mestra.

É deste modo que São José de Cupertino deve ser visto por nós. Ele é um exemplo dos sacrossantos extremos conciliáveis da Igreja Católica. No Céu, lado a lado, é possível que se vejam São José de Cupertino e São Tomás de Aquino venerando a Nossa Senhora com o culto de hiperdulia e adorando a Nosso Senhor Jesus Cristo. Cantando juntos, por toda a eternidade, hinos em que o sumamente inteligente e o sumamente ininteligente compõem um louvor perfeito. Porque precisamente a perfeição desse louvor está na harmonia das coisas sumas, opostas sem contradição.

Os metafísicos ensinam que a harmonia perfeita não é aquela que reúne coisas iguais, mas é aquela que cobre uma imensa gama de diferenças, encontrando nessas últimas pontos de analogia e mostrando por onde é que tal harmonia se dá.

Assim é que devemos considerar a vida de São José de Cupertino e esses últimos comentários que sobre ele devem ser feitos. 

São José de Cupertino eleva-se em vôo ao ver a igreja que abriga a Santa Casa de Loreto

Agora, leremos outros prodígios de sua vida: 

‘Frei Burro’ voava no ar como pássaro. Não há quase em vida de santo outro exemplo com a mesma faculdade levada tão longe. 

Os senhores imaginem o Frei coitado que, de repente, se levanta e vai para o alto do morro, voando, numa época em que a aeronáutica seria completamente impossível. E os senhores compreenderão a suma modéstia e a suma despretensão que se precisava ter porque facilmente isso podia dar em orgulho. Dizer para alguém: “Bom, eu vou agora para o alto do morro”, levanta vôo e voar como um pássaro, a todo momento, para todo lado e quando queria... E depois os senhores têm que imaginar que isso se fazia com graça, com todo o charme das coisas celestiais.

São José de Cupertino passou literalmente uma parte de sua vida no ar, de tal maneira ele voava, real e fisicamente entre o céu e a terra. Suspenso. 

Ele, um dia, prometeu a umas religiosas um pássaro que lhes ensinaria a cantar, porque achava que as religiosas cantavam mal. 

Ele também não sabia cantar, mas sabia prometer um pássaro que ensinaria a cantar...

Imaginem que coisa linda um convento de religiosas verdadeiras, mas de canto rouco, ou de canto esquisito, agudo, e de repente vem o pássaro prometido por São José de Cupertino e começa a cantar para elas. Pode haver uma coisa mais bonita do que essa? Todos os dias, no ofício da manhã e da tarde, eis que um pássaro aparece no coro, guiando e reanimando o canto das religiosas. Quem de nós não aceitaria de ser burro – se fosse essa a vontade de Deus – para ter tal domínio divino sobre as coisas da natureza?! 

Um dia o pássaro sumiu. Fizeram queixas a José. Resposta dele: 'O pássaro fez bem. Por que o insultastes?’ Uma religiosa lhe havia feito não sei que insulto a esse pássaro.

Dir-se-ia que era uma progressista do século XX... 

Contudo, São José prometeu a volta do pássaro, que retornou. Dessa vez estabeleceu regras entre as religiosas.

Vejam o perdão. Como ele voltou, voltou perdoando. Então, foi morar entre elas. Ele que só vinha duas vezes por dia, pela largueza do perdão, foi morar entre elas.

Os senhores não acham que isso tem uma candura que o mundo de hoje perdeu quase completamente o “segredo” e até a noção? Isso causa um sorriso que não se sabia que pudesse causar... Falam muito em férias. Repouso é quem vê isso! É muito mais do que tomar um avião e ir para o Turquestão, para ver o que lá aconteceu... 

Sem dúvida ele tinha esquecido e tinha perdoado. Mas havendo uma das freiras atado à sua pata um guiso, ele desapareceu por algum tempo. José tornou a chamá-lo ainda. ‘Eu vos tinha dado um músico’, disse ele às religiosas. ‘Não havia que fazer dele um sineiro. Ele foi velar junto ao túmulo de Jesus Cristo, mas voltará’. Realmente, voltou e só desapareceu quando o santo morreu.

Quer dizer, o pássaro foi a Jerusalém velar junto ao túmulo de Jesus Cristo. Quando o santo mandou, o pássaro voltou e passou a cantar nesse convento até ele morrer. Quando o santo faleceu, estava desfeito esse ato de ligação entre o Céu e a terra e o pássaro foi embora. Mas estava o convento perfumado com uma legenda lindíssima por todos os séculos...

Aí está o encanto da Europa católica! É possível que ainda se saiba qual é o convento em que frei tal tenha feito um vitral lindo representando o pássaro, que haja a festa do pássaro, que haja um órgão que imite o trinado do pássaro e que haja toda uma representação desse pássaro por todos os séculos... Como é possível também que haja ônibus repletos de peregrinos que vão para lá nessa festa e venerar  essas coisas.

De qualquer forma os senhores vejam a “douceur de vivre”, a doçura de viver que está numa coisa dessas e como a verdadeira doçura da vida está nos homens penitentes que abandonam tudo, está na ascese, está exatamente na renúncia das  coisas sem as quais a existência parece aos homens tão amarga. Bastaria um santo capaz de fazer coisas dessas que traria tanta doçura para a terra... 

Um dia, perto do bosque de Grotella, São José encontrou suas lebres e lhes disse: ‘não vos afasteis da Madonna (imagem de Nossa Senhora), porque muitos caçadores estão perseguindo aqui’. Ao cabo de alguns minutos, uma delas é surpreendida e perseguida pelos cães. A porta da igreja está, porém, aberta. Ela atravessa a nave e atira-se nos braços do santo.

Isso são imagens da mansidão divina. É para representar o pecador, que vai fugindo das perseguições e se atira nos braços de Nossa Senhora. 

‘Eu não tinha te avisado?’ diz São José. Os caçadores sobrevêm excitados e reclamam barulhentamente a sua presa. ‘Essa lebre, responde o santo, está sob a proteção da Madonna, não a tereis’. Depois abençoou o quadrúpede e o pôs em liberdade.

Enquanto voltava da capela ao convento, outra lebre veio a ele assustada. O caçador, que era o Marquês Cosme de (...?...), senhor de Cupertino, de onde ele era natural, pergunta-lhe se viu a lebre. ‘Aqui está ela nas dobras de minha túnica, responde José. Essa lebre é minha. Poupai–a e não venhais mais caçar aqui, porque amedrontais’.

Vejam o senhorio do "Frei Burro". 

Depois, falando à lebre: ‘esconde-te naquela moita e não te mexas’. Os cães, que seguiam a presa, ficavam imóveis e tementes, pregados no seu lugar.

É a imagem exatamente do pecador, ou da pessoa tentada, que recorre à Nossa Senhora. O demônio fica temente, mas não ousa nada, porque está sob a proteção dos santos e da Madonna.

Os senhores querem uma coisa mais doce, os senhores querem uma coisa que dá mais equilíbrio ainda a todas nossas teses a favor das desigualdades justas do que esse marquês de Cupertino, que encontra diante de si um mendigo, que da parte de Deus lhe diz ‘Essa lebre é minha e não sua’?... O marquês é o dono da terra, hein?! E, portanto, dono da lebre. ‘Essa lebre é minha e não sua. Eu conservo aqui essa lebre’. E depois diz à lebre: ‘fica em paz porque a Madonna te protege’. Depois os cães querem avançar e não podem... E o marquês contente e todo mundo comentando... Durante um ano, junto à lareira do castelo, à noite se comenta o caso da lebre e do marquês, não é verdade? Isso é ou não é a doçura da vida? Isso é ou não é a alegria da virtude?...

Notem o seguinte: sempre que o demônio promete qualquer coisa, o boboca que tome em consideração que é aquilo que o demônio vai lhe tirar! Prometeram a felicidade, acabaram com essas coisas na terra. A alegria de viver sumiu! Apareceu prazer, apareceu luxúria, apareceu a meretriz posta no lugar onde outrora não tinha. Apareceu o desejo do lucro. Apareceram as inquietações da sede de importância. Apareceu tudo... mas a paz, o sorriso sumiram da terra. Essa espécie de doçura angelical, essa espécie de coisa diáfana que se nota nos quadros de Fra Angelico sumiu da terra. E o demônio apresenta essas inquietações, esses frenesis como sendo prazer; e como sendo um desprazer essa aura que cerca São José de Cupertino e toda a beleza e poesia da Idade Média.

Aí os senhores estão vendo a mentira do demônio. É por causa disso também que quando o demônio tenta alguém, normalmente o faz sob pretexto do prazer, pretexto do prazer proibido, pretexto da importância, pretexto da grande situação, pretexto do dinheiro. Se ele tenta sob determinado pretexto, tenham certeza, é isso que o demônio vai tirar. E não há coisa mais amarga do que o fruto que se escolhe fora da vocação para a qual se foi chamado. Quando a tentação vem, ou a pessoa reza ou ela acredita na mentira e o que vai encontrar é frustração.

Estou me alongando um pouco demais... a “culpa” é de São José de Cupertino. 

Uma tempestade destruíra quase todas as ovelhas de uma aldeiola. Os pastores, desolados, foram ter com José.

É ou não melhor do que o ”Instituto de Seguros Anti-chuva”?... Faz o requerimento por causa da lei social n° tal... e depois não vem nada. 

O santo tocou uma a uma as ovelhas mortas. ‘Em nome de Deus, levanta-te’, dizia ele tocando-as. E as ovelhas se levantavam.

O que comentar? O que dizer de uma coisa dessas?... 

Outra vez, ele atraiu uns carneiros à capela de Santa Bárbara. Saltando por cima das barreiras e abandonando suas gordas pastagens, os carneiros acudiam em multidão para estarem junto a José na oração.

Ao simples nome de José e de Maria pronunciados diante deles, sucedia que São José se revelava mesmo materialmente. Com freqüência iniciava seus êxtases por um grande grito: ‘Agora, não!’ Mas esse grito não causava medo e essa significação foi importante para sua canonização.

A Igreja toma precauções imensas para discernir os espíritos. O Espírito Santo não agita, não perturba, não é cacofônico. Mas, pelo contrário, ele dava um brado harmônico. 

Um dia D. Antônio passeava com José no jardim.

Não sei quem é esse D. Antônio. 

‘Frei José, diz Antônio, como Deus fez um belo céu!’ José profere um brado, voa e vai pousar de joelhos no cimo da oliveira. O ramo, diz o inquérito, balouçava como ao peso de uma ave. Ele aí ficou cerca de meia hora.

Um dia na igreja, durante um arroubo, a sua mão achou-se estendida sobre a chama de duas tochas. Por algum tempo, imóveis de estupefação, os espectadores cogitaram se era o caso de remover as tochas. Mas as mãos dele não apresentavam nenhum vestígio de queimadura. Ele estava rezando.

Um dia um trabalhador, deixando cair a ferramenta, fez uma larga ferida. José toca aquele dedo meio decepado, enrola com uma atadura e diz ao operário: ‘pode ir trabalhar’. O operário estava curado. Era uma cruz que ele estava fabricando. ‘Plantemo-la’, diz José. Ela era, no entanto, tão pesada, que não a podiam plantar. José impacienta-se, lança fora o manto e transpõe voando o espaço de quinze passos...

Seria preciso um volume inteiro para narrar fatos desses. Encaminho o leitor à Vida de São José, por Domingos Jovino.

Quem sabe se alguém pode tomar uma nota e mandar vir essa Vida de São José por Domingos Jóvino ou Jovino, não sei como se pronuncia, porque deve ser uma verdadeira beleza! E eu me comprometo a contar aos senhores mais alguns episódios da vida de São José de Cupertino.

*      *     * 

O que devemos tirar como conclusão desses episódios?

Lembro-me que quando eu era congregado mariano de Santa Cecília – nos saudosos tempos em que a Igreja ainda apresentava as aparências de seu esplendor –, havia uma música que o coro cantava em latim: “Dá paz, Senhor, a nossos dias, porque não há outro que lute por nós, a não ser Tu, ó Deus, Senhor Nosso”.

Assim também devemos dizer isso pensando em São José de Cupertino. Devemos nos voltar a Nossa Senhora, que é o canal de todas as graças, e dizer-Lhe: “Nossa mãe, dai-nos a paz em nossos dias. Essa paz de alma de que se tem um pouco do perfume pensando nesses fatos da vida de São José de Cupertino. Dai-nos a capacidade de degustar essas coisas; de fazer da lembrança delas o nosso entusiasmo e a alegria de nossa vida. Porque não há, ó Minha Mãe, ninguém que lute por nós a não ser vós, Mãe e Senhora Nossa”.

 

 Porta de la Craffe, Nancy (França)

Que nós nos encantemos com a Civilização Católica. Pensemos na nobreza, no Sacro Império Romano Alemão, na realeza, nas Universidades, nas corporações, no estilo gótico, no feudalismo... mas vejamos bem no meio de tudo isso a verdadeira flor: os santos que desabrocharam em tudo isso e que eram a causa profunda do equilíbrio e da paz de tudo isso. Que Nossa Senhora nos abençoe e nos faça ver nisso um antegozo do Reino de Maria (*).

Quando o Reino de Maria vier, os senhores talvez se lembrem dessas conferências e digam: realmente, a era de São José de Cupertino voltou! Nossa Senhora me ajudou e eu não acreditei nas mentiras do demônio. Não sacrifiquei a Satanás, às suas pompas e às suas obras. Mantive puro o meu corpo, mantive minha alma limpa do pecado da Revolução. Eu a odiei, não amei nada do que ela amou e odiei tudo quanto ela amou. Amei com todas as veras de minha alma tudo quanto ela odiou. E por isso Nossa Senhora me fez atravessar toda a fornalha da “Bagarre” (**), para que antes que meus olhos exaustos descansem no Céu, ainda contemplem a glória dEla nessa terra. Essa será nossa grande alegria, nossa grande recompensa!


(*) Reino de Maria: Esta expressão exprime aquele ideal de sacralização da ordem temporal através da mediação de Maria, que mais não é do que a Civilização Cristã, sempre apontada como meta pelos Pontífices. A Civilização Cristã, que se submete inteiramente a Deus e reconhece a suprema Realeza de Jesus Cristo e de Maria; é, neste sentido, "sacral" e hierarquicamente ordenada (cfr. "O Cruzado do século XX - Plinio Corrêa de Oliveira", Roberto de Mattei, Civilização Editora, Porto, 1996, Cap. VII, n. 7).

(**) Bagarre: Um grande triunfo da Igreja e da Civilização Cristã, depois de uma crise, metaforicamente definida na linguagem quotidiana da TFP com esta palavra francesa - cfr. Idem, Cap. VII, n. 10).